Pseudociência nas alturas

Último dia do ano. Eu queria na verdade estar surfando nos mares do sul mas o vento nordeste de 20 nós e o mar mexido não permitem. Então aproveito para o último post do ano. Dei uma olhada nos vários inacabados e escolhi esse assunto porque é muito bom.  O Guilherme Genestreti da Folha tinha me entrevistado em agosto sobre uma nova família de pulseiras do equilíbrio. Trata-se da iBalance, anunciada pela empresa chinesa Oregon Scientific Brasil no Blogger (estranho usar o Blogger para promover um produto comercial...) com um preço recomendado de R$99. O texto promocional é um amontoado de bobagens entoado em linguajar tipicamente pseudo-científico. A melhor parte é "Os íons negativos são capazes de aumentar os níveis alcalinos do corpo, o que neutraliza os íons positivos e melhora a circulação sanguínea, elevando a temperatura corporal e o equilíbrio do metabolismo." Isso não significa rigorosamente nada. A iBalance "recebeu o certificado e registro da Associação Japonesa de Pesquisa e Aplicação de Íons (The Japan Association of Ion Research and Application)". Ah, bom! Então a tal pulseira é certificada pela obscura JAIRA. No entanto, infelizmente a página da JAIRA é em japonês e organizada de forma que o Google Translate só consegue traduzir o menu para o inglês. Mas a página da Eco-Holistic Inc.  tem explicações em inglês. Ali é possível descobrir que a JAIRA apareceu para "endireitar o caótico mercado de íons negativos no Japão". Que sorte. Assim a gente fica livre de picaretas! Desnecessário dizer que a Eco-Holistic dedica-se a vender geradores de íons negativos para incautos. Um dos produtos, o iOnion deve ter um baita cheiro de cebola . Tem mais na página de Hong Kong da Oregon Scientific, que dado o tom do que afirma na verdade devia se chamar Oregon PseudoScientific. Ainda que houvesse qualquer evidência de que aumentar a densidade de íons negativos tivesse algum efeito benéfico para a saúde (estou agora próximo ao mar, com uma alta densidade de do íon negativo Cl- no ar, o que na verdade tem um efeito corrosivo sobre estruturas metálicas), não há como uma pulseira com dois imãs gerar íons negativos sem uma fonte de corrente associada, ou ela mesma rapidamente assumiria uma maléfica carga positiva...

Revista da Lufthansa
Revista da Pluna
 Mas a Oregon não está sozinha nisso. Eu tenho viajado muito nos últimos tempos (essa é uma das razões pelas quais algumas vezes levo tanto tempo para produzir um novo artigo). Na falta do que fazer em aeroportos e aviões algumas vezes leio a revista de bordo ou de vendas sem impostos de companhias aéreas. É falta do que fazer mesmo! Para minha surpresa encontrei na alemã Lufthansa a propaganda da Lunavit, uma variante da iBalance. Pelo menos na página eles dizem os supostos "efeitos são controversos na Alemanha e não reconhecidos pela medicina ortodoxa". Germanicamente é exibido um esquema da pulseira: dois imãs com um bloquinho de germânio 99,9% entre eles (no meu laboratório eu só uso germânio 99,999%). O germânio é um semicondutor que era muito usado nos anos 60 para confeccionar diodos e transistores até o desenvolvimento da tecnologia do silício. Se alguém souber como dois ímãs e um pedaço de germânio podem gerar íons negativos por favor me avise. Por 79 euros ou 23 mil milhas, essa pulseira é a mais cara. 
A uruguaia Pluna oferece a Enerjii, sua versão por US$ 29. Nesse preço não dá para oferecer o germânio 99,9%, mas somente "silicone com íons negativos, bolas de cerâmica e ímãs de neodímio". É a versão sul-americana. Dado que o efeito das 3 pulseiras é o mesmo: nenhum. Melhor ser enganado pela Pluna...

Bom 2012 para todos (melhor ir aproveitando bem porque se os apocalípticos estiverem certos quando chegar 21/12 vai ser um problema...)

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