Em 1999 o Discovery Institute, entidade que se dedica a difundir e propagar a pseudociência que eles chamam de intelligent design (design inteligente segundo quem conhece mal a língua inglesa) publicou um documento estratégico. O documento se chama A Cunha. O documento propõe uma estratégia para aceitação e difusão do intelligent design na sociedade americana. O documento é bem estruturado, com objetivos e estratégias a médio e longo prazo.
Os principais objetivos são:
Os principais objetivos são:
- Derrotar o materialismo científico e suas heranças moral, cultural e política.
- Substituir as explicações materialísticas pela compreensão teística de que a natureza e os seres humanos foram criados por Deus.
Quando eu li isso pela primeira vez, somado aos grafismos tão amadores e fontes de tão mau gosto, minha primeira reação foi achar que se tratava de uma fraude/piada, no estilo do Flying Spaghetti Monster. Não era. O documento é autêntico. A Estratégia da Cunha consiste em introduzir as ideias do intelligent design por alguma fresta e ir progressivamente expandindo sua influência, como uma cunha em madeira (dãããã). A estratégia inicial era fazer o intelligent design ser aceito como uma alternativa nas ciências e na pesquisa científica. Isso deveria ser acompanhado por debates em instituições de ensino e na vida em geral.
Ensine as duas teorias... Deixe as crianças decidirem. |
Felizmente a estratégia da cunha falhou fragorosamente nos EUA. Nenhuma universidade séria realiza palestras ou debates sobre o assunto (OK, o orientador do William Dembski o convidou para dar um seminário na Universidade de Chicago, mas isso não teve grandes consequências e suscitou protestos na universidade), e as tentativas de propor a interpretação do intelligent design nos currículos de ensino médio foi amplamente rechaçada. Como alertou o emérito educador Mark Terry, "Só uma revolução científica esquisita busca estabelecer sua posiçao nos currículos de ensino médio antes que a pesquisa tenha sido comprovada. Esse óbvio obstáculo será removido se a revolução for efetivamente baseada numa redefinição da ciência em lugar de novas pesquisas".
A Sociedade Brasileira do Design Inteligente foi fundada recentemente lançando um manifesto que equivale a uma carta de intenções. Esse manifesto repete, de forma adaptada às condições locais, exatamente a Estratégia da Cunha:
- Não são favoráveis, na atual conjuntura acadêmica, ao ensino da Teoria do Design Inteligente (TDI) nas escolas e universidades brasileiras públicas e privadas, como também nas confessionais.
- Criticam o ensino da Teoria da Evolução invocando um "direito constitucional dos alunos de serem informados que há uma disputa já instalada na academia entre a Teoria da Evolução e o intelligent design quanto à melhor inferência científica sobre nossas origens". Eles devem estar se referindo à academia de ginástica ondem praticam seus abdominais. Na academia científica, onde a ciência avança através de publicações em periódicos sérios, não há disputa alguma. As discussões sérias sobre Evolução passam longe do intelligent design.
- Para se diferenciar do criacionismo estritamente religioso eles o enviam para "aulas de filosofia e teologia". É uma estratégia para parecerem científicos.
Será que a estratégia da cunha está funcionando nas terras tupiniquins?
Parece que sim.
O folclórico deputado Marco Feliciano apresentou o projeto de lei 8.099/14, que propõe o ensino de criacionismo nas escolas. O Partido dos Trabalhadores corretamente decidiu denunciar e apresentar críticas ao projeto em sua página. No entanto, o partido errou fortemente ao consultar sobre o assunto não uma sociedade científica séria como a SBPC ou a Academia Brasileira de Ciências, mas justamente a pseudocientífica Sociedade Brasileira do Design Inteligente (só não tem link porque eles não têm página na web ainda). Que posa de defensora da ciência "que o mundo empírico nos revela".
É péssimo para a ciência brasileira que o partido do governo reconheça uma sociedade pseudocientífica como autoridade acadêmica. Espero que as sociedades científicas sérias em algum momento desautorizem publicamente a Sociedade Brasileira do Design Inteligente.
O Presidente Executivo da Sociedade Brasileira do Design Inteligente afirma no Facebook que estará "em breve submetendo uma carta às sociedades e periódicos científicos brasileiros defendendo o ensino da TDI".
Será uma ótima oportunidade para que as sociedades e periódicos científicos brasileiros tomem uma posição relegando pseudociência ao seu lugar e bloqueando definitivamente a Estratégia da Cunha Tupiniquim.
Será uma ótima oportunidade para que as sociedades e periódicos científicos brasileiros tomem uma posição relegando pseudociência ao seu lugar e bloqueando definitivamente a Estratégia da Cunha Tupiniquim.
Comentários
Impressiona o silêncio do psdb sobre o assunto